quinta-feira, 3 de junho de 2010

Crônicas Acervo 008



Iraci de Souza Spínola

Crônicas de junho de 2010


Olá caro leitor!

Para você visitar as primeiras postagens
tem de clicar no elenco inicial de 2009
onde aparecem as
crônicas 001 e as subsequentes até 024.

Há os acervos
02 (de 025 a 035), 03 (de 036 a 043)
e 04 (de 044 a 055).

O acervo 05 contém a 056 até a 071.

Você pode ver
as crônicas de maio a partir da de número 072
e as de junho a partir da número 077.
Faça seus comentários...

Abraços / I. Spínola




Crônica 077
Memórias Incontáveis de Incontáveis Memórias
As civilizações poderão variar conforme o clima, o ambiente, a alimentação, mas a cultura é, em todo o mundo, a mesma, a de ser compassivo, evitar o mal, ser generoso, não ser invejoso, perdoar e porque tanto aqui como algures o homem deseja a paz e a fartura.

O desejo de estar em segurança, de alcançar um fim cobiçado, faz surgir aceitação de dirigentes, o seguimento do exemplo, o culto do sucesso, a autoridade dos líderes, dos salvadores da pátria, dos mestres, dos sacerdotes, dos reverendos, dos bispos, dos pastores, dos gurus, sendo que tudo isso é apenas falta de reflexão, é simplesmente pura imitação.


Como o indivíduo se vê inseguro e cercado de impermanência, tem o desejo de procurar alguma coisa segura, duradoura, mas esse desejo é impulso do medo. Refugia-se no conhecido que são as crenças, os ritos, as fórmulas dos reverendos, as promessas de vida melhor e, às vezes descendo à busca de talismãs, amuletos, sinais fortuitos, pés-de-coelho e de outros expedientes menores e bem primitivos e essas coisas são conservadas como vivas de geração em geração.


E o que é aconselhável a mim e a você? Para subsistir, somos forçados a pensar, com um pensamento conforme opera em nossa vida de cada dia, em nossos contatos diários e reações conseqüentes.





Crônica 078

Memórias Incontáveis de Incontáveis Memórias



Minha memória sob decodificação de dados, sua memória estudioso leitor, tradição, experiência, e, esta, ampla ou minúscula, e a reação a qualquer conhecimento adquirido por prática nova é produto do passado. A experiência está sempre a tornar forte o passado porque a mente é resultado do passado, do tempo. O pensamento é o produto de muitos dias passados. É isso mesmo? Você, que é aplicado ao estudo, aceita bem essas colocações aqui feitas? Veja bem, se estamos errados, o que nos falta é refletir ainda mais.

O apelo à tradição estribado na assertiva de ‘quanto mais antigo melhor’ pode nos levar a conclusões enganosas porque está apostando que crenças antigas estão sempre certas, o que não é verdade, como a medicina demonstra com suas novas descobertas. Vamos ver aqui um simples exemplo?


‘A astrologia é uma arte praticada há milhares de anos no Oriente. Conta-se que os antigos reis da Babilônia teriam feito uso dela para saber os dias mais propícios para as batalhas. Até os imperadores chineses recorriam aos astros para guiarem seus passos no governo. Com esse currículo respeitável, é inadmissível que ainda não a considerem uma ciência’.


Ledo engano. Trata-se de mais uma pseudociência. Adultos crêem em duendes e em bruxas pela mesma razão que crêem que o mundo está repleto de espíritos e forças que ajudam a arrumar o caos e tratam de invocá-los como podem. Essas crenças dos povos primitivos têm tanto fundamento quanto as tolices oferecidas pelos que andam por aí distribuindo dons sagrados como o dom de falar línguas e de receber o espírito santo como se vê hoje em algumas igrejas ditas evangélicas se contorcendo em nome desses dons.


Está-se-me tornando um pouco fatigante recorrer a essa argumentação... O homem gosta de matar, desde tempos remotos, seja uns aos outros, seja um inocente antílope, cobras e aves que estão a cantar alegremente no bosque, matar por esporte, matar para comer ou matar pela pátria, pela paz, matar com os meios de destruição cada vez mais diligentemente cultivados e reforçados com tecnologias de ponta. É isso aí gente!






Crônica 079

Memórias Incontáveis de Incontáveis Memórias



Um pequeno pandeiro batia num ritmo alegre, e pouco depois um cavaquinho começou a acompanhá-lo. Os dois juntos enchiam os ares de sons. O pandeiro predominava, mas acompanhado do cavaquinho.


Quando o cavaquinho se calava, entrava o som da viola e a seguir o triângulo, mas o pandeiro prosseguia enérgico, sonoroso, até que de novo retornava o cavaquinho e a eles iam se juntando o agogô, o chocalho e o reco-reco numa sonoridade alegre num ritmo dançante. A alvorada ainda estava longe e os pássaros quietos, mas a música enchia o silêncio. Festejava-se um casamento na pequena vila.



Na véspera, um sábado, reinava muita alegria. Os cânticos e os risos se prolongavam até tarde da noite, e agora os convidados estavam sendo despertados por aquela música. Afinal, os ramos das árvores começaram a se desenhar contra o céu e o com início de seu alvor, as estrelas se apagavam e a música cessou. Estava amanhecendo. Começou-se a ouvir os gritos e as vozes de crianças. O sol despontava no horizonte e o dia começava a se firmar. Elas discutiam com muito barulho e, completamente absorvidas na sua zanga, não davam a mínima atenção a ninguém mais, nem ninguém lhes dava atenção nenhuma. Como todos os rituais, era estimulante, e aquelas mulheres estavam se confortando e isso devia ser um ritual diário.



Ali bem próximo uma velha ajudou uma mocinha a pôr na cabeça um jarro grande de barro. A adolescente tinha na cabeça uma rodilha de pano para dar sustentação ao jarro, o qual ela amparava levemente com as mãos. Outras mulheres chegavam e se iam com os vasos cheios de água, mas a discussão continuava acesa, dando-me a impressão de que nunca mais acabaria.
Entrementes, as três se calaram, encheram de água seus vasilhames e se foram com se nada tivesse acontecido, ou como se fosse um movimento final de um concerto com a batuta do maestro indicando que ali o concerto terminava. ‘Allegro maestoso’, acredito.

A estas horas o sol esquentava e a fumaça subia dos tetos das casas de palha da vila. Era hora de iniciar o preparo da refeição do dia. De repente tudo ficou tranqüilo. Depois de se acabar o bate-boca já se podia ouvir o vento balançando a copa das árvores.






Crônica 080

Memórias Incontáveis de Incontáveis Memórias


Uma forte chuva começava nas primeiras horas da manhã com trovões e relâmpagos, e agora a chuva se intensificava arrastando terras e folhagens e a terra vermelha que era utilizada para cerâmica se empapava.


Os animais de carga, jumentos, mulas e burros tinham-se abrigado debaixo de uma grande árvore que ficava perto de uma cancela e esta ao lado de uma estrebaria.


Alagamentos e deslizamentos obstruíam os precários caminhos que davam acesso às moradias, casa de taipa com piso de barro. Se algum muar ficava desabrigado poderia no caso de chuva demorada, morrer e, assim que sol brilhasse os urubus sobrevoavam e devoravam a carniça em avançado estado de putrefação. Essa ocorrência era habitual nas terras secas do município de Itaberaba, sertão baiano.




A luz do entardecer se espelhava nas águas e os vultos escuros das árvores se desenhavam contra o sol poente. Era o momento do ocaso do astro-rei. Passou uma marinete naquele instante, repleta de passageiros, indo para a cidade de Valença na Bahia. Já estávamos sentados à margem de um estreito rio, à beira d’água, num morno lajedo. A cidade fica um pouco mais adiante.



Na outra margem, sob uma árvore abundante em ramos, um garoto cantava suavemente. O sol descia atrás de nós e nossas sombras caíam sobre a água. Era um tranqüilo e belo entardecer com algumas nuvens alaranjadas e o rio se movia incessantemente.

Um bando de pássaros passou por ali e pousou perto da água, e minutos após, outros pássaros juntaram-se aos primeiros. O burburinho ficou por conta dos pássaros porque no mais era um completo silêncio.






Nenhum comentário:

Postar um comentário