segunda-feira, 5 de abril de 2010

Crônicas Acervo 006





Iraci Spínola



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O acervo 05 está em março de 2010
a partir da crônica 056 e o elenco de abril
fica a partir da crônica 068.
Abraços / I. Spínola



Crônica 068
Memórias Incontáveis de Incontáveis Memórias



Minha mãe nasceu em Lagoa Queimada, vilarejo da Cidade de Amargosa na Bahia. Ela me contava das perversidades dos bandos comandados por Lampião e dos roubos de animais de carga e de montaria ou trocando os animais cansados por novos e vigorosos. Lampião e Maria Bonita, como todas as lendas que tendem a se tornar maiores que os fatos, a de Lampião e sua saga pelo nordeste brasileiro incluem todos os elementos de aventura, romance, violência, amor e ódio das histórias da humanidade. Nasceu em julho de 1897 numa pequena fazenda de seus pais em Vila Bela, atual município de Serra Talhada, em Pernambuco, terceiro filho de uma família de oito irmãos. Desde criança mostrou ser excelente vaqueiro, mas um conflito com um vizinho o jogou na clandestinidade após o assassinato de seus pais.


Foi o maior cangaceiro, nome dado aos ‘fora da lei’, que viviam de forma organizada no final do século XIX e início do século XX na região do nordeste brasileiro. Percorreu sete estados da região nordeste durante as décadas de 1920 a 1930, levando sangue, morte e medo à população do sertão. Causou grandes transtornos à economia do interior e sua história é um misto de verdades e mentiras. No início da década de 30 mais de quatro mil soldados estavam em seu encalço em vários Estados e seu grupo contava então com 50 elementos entre homens e mulheres.

Roubava de comerciantes donos de mercearias e de pequenos fazendeiros, e seus atos de crueldade lhe valeram a alcunha de ‘rei do cangaço’. Para matar, enfiava longo punhal entre a clavícula e o pescoço. Seu bando sequestrava meninas adolescentes, crianças, punha fogo em fazendas, exterminava rebanhos de gado, roubava cavalos, estuprava coletivamente, torturava e marcava o rosto de mulheres com ferro quente.

Antes de fuzilar um de seus próprios homens, obrigou-o a comer um quilo de sal, e noutra ocasião, assassinou na presença da esposa do falecido, um prisioneiro que implorava perdão. Lampião arrancava olhos, cortava orelhas e línguas sem a mínima manifestação de piedade. Perseguido, viu três de seus irmãos morrerem em combate e ele foi ferido seis vezes. Em 1929, conheceu Maria Bonita, a mulher de um sapateiro chamado Zé Neném. Aos 19 anos de idade ela se declarou ‘apaixonada’ pelo cangaceiro e pediu para acompanhá-lo. Lampião concordou, ela enrolou sua trouxa e acenou um leve adeus para o descrente marido de então.

Considerado um bom estrategista na luta armada, quase sempre saía vencedor nas lutas com a polícia, pois atacava de surpresa e fugia para esconderijos no meio da caatinga, onde sempre acampava por vários dias até o próximo ataque. Paradoxalmente tornou-se amigo de coronéis e grandes fazendeiros que lhe forneciam abrigo e apoio material.

Morreu em 1938 na Fazenda Angico em Sergipe. Os trinta homens e cinco mulheres estavam, pela manhã, começando a se levantar quando foram vítimas de uma emboscada de uma tropa de quarenta e oito policiais de Alagoas comandada pelo tenente João Bezerra. O combate durou somente 10 minutos. Os policiais tinham a vantagem de quatro metralhadoras. Lampião, Maria Bonita e nove cangaceiros foram mortos e tiveram suas cabeças cortadas. Ela foi degolada viva. Os outros conseguiram escapar. O cangaço terminou em 1940 com a morte de Corisco, último sobrevivente do grupo comandando por Lampião.





Crônica 069
Memórias Incontáveis de Incontáveis Memórias



Corisco nasceu em 1907 na localidade de Matinha de Água Branca, no Estado de Alagoas. Em agosto de 1926, entrou para o bando de Lampião, recebeu o apelido de Corisco, sequestrou Dadá quando ela tinha apenas treze anos de idade, à força, e a colocou na sela de seu cavalo e fugiu pela caatinga afora. Morena, tinha cabelos pretos e 1,70 m de altura. Desvirginada brutalmente pelo diabo louro a adolescente sofreu uma hemorragia tão intensa que quase morreu.


Com o passar do tempo, porém, o ódio sentido por ela se transformou em simpatia... É o que se diz.
Da mesma forma que a treinou para o uso de diversos armamentos, Corisco a ensinou a ler, a escrever e a contar. Por sua grande coragem, era admirada pelos bandidos que certos chefes de bandos ressaltavam que ela valia ‘mais do que muito cangaceiro!’ Teve sete filhos, mas apenas três deles conseguiram sobreviver. De 1921 a 1934 Lampião dividiu seu bando em vários subgrupos dentre os quais os chefiados por Corisco, Moita Brava, Moreno, Labareda, José Sereno, Português, Baiano e Mariano, mas para o rei do cangaço, entretanto, o de Corisco sempre foi o bando mais importante de todos. Além de comparsas, os dois eram grandes amigos. Quando Lampião foi morto, Corisco e Dadá estavam na fazenda Emendada, em Alagoas.


Com a morte do chefe do bando, Corisco assumiu o comando do bando. Mas, em 1939, durante um duro combate contra três volantes na fazenda Lagoa da Serra em Sergipe, foi ferido e nunca mais se recuperou. Ficou com a mão direita paralisada e o braço esquerdo atrofiado. Um ano depois, dissolveu o bando, e apenas na companhia de Dadá, Rio Branco e mulher, partiram os quatro para o sul da Bahia à procura de um refúgio seguro.
Iniciou, então, uma longa jornada pelo sertão, e para evitar ser reconhecido, vestiu-se de vaqueiro, cortou os longos cabelos avermelhados, aboliu o chapéu e as roupas do cangaço e com o ouro que roubara durante todos aqueles anos planejou ter uma vida diferente. No dia 5 de maio de 1940, por fim, na região de Brotas de Macaúbas, na Bahia, uma volante cercou o que restou do grupo e Corisco foi atingido na barriga por uma rajada de metralhadora ficando com os intestinos à mostra. Fim do cangaço.


A bravura e a crueldade dele foram celebradas pelo cineasta Glauber Rocha, na expressão de “se entrega Corisco!” em cenas de ‘deus e o diabo na terra do sol’. Em uma das cenas antológicas o cangaceiro respondia ao seu perseguidor que se entregaria somente em outra vida. Os fatos históricos, porém, mostraram que no derradeiro conflito, ao ser atingido mortalmente pelos projéteis, ele gritou apenas que ‘maiores são os poderes de Deus!’




Crônica 070
Memórias Incontáveis de Incontáveis Memórias


O sol irradiava bem cruel. A terra estava torrificada e fendida, e as poucas árvores estavam cobertas de uma poeira marrom, e, pela manhã não havia sequer orvalho. A estrada descrevia curvas por entre as colinas numa sucessão de léguas. Num raio de alguns quilômetros não havia habitação de espécie alguma. Não havia aves por ali nem se viam animais selvagens, afora alguns calangos e lagartixas, somente cobras e caranguejeiras mortas. Não havia água, senão num ou noutro lugar onde se perfurou poço artesiano para mitigar a sede do gado em coxos nos currais, e, árvores somente alguns pés de umbu que resistem bem às fortes secas.

Era a estrada que me levava à Cidade de Itaberaba na Bahia que se encontrava em pleno verão, pastos secos, animais magros, animais mortos e caveiras já desprezadas pelos urubus.



Mulheres desciam ladeiras com feixes pesados de lenha à cabeça, certamente lenha para cozinhar e que cada uma delas equilibrava na cabeça, protegida por uma rodilha de pano. Nenhum calçado tinha aos pés embora fosse penoso o caminho. Seus maridos tinham ido para a cidade esperando encontrar trabalho que lhe rendesse algum dinheiro. A vida das mulheres agora era apanhar lenha e assim haveria de ser até a chuva retornar ou até morrer, com alguma pausa, de tempos em tempos, para parir um filho. Ali todos nasciam com fome, viviam com fome e morria com fome, era a sina de todos eles. E o sol ainda irradiava bem cruel.

Uma das coisas que aprendemos da astronomia é que o nosso astro-rei, o Sol, é uma estrela de quinta grandeza. Entretanto, essa afirmação tão repetida durante décadas, é apenas uma das inúmeras frases que memorizamos e carregamos até o fim da vida como se fosse conhecimento. Embora exista uma verdade embutida na ‘quinta grandeza’ do Sol, se continuar na busca pela fonte do problema, pode ser que encontremos um livro no qual a palavra ‘magnitude’, foi traduzida para o português como ’grandeza’.


Não são poucas as pessoas imaginando que existam somente quatro estrelas maiores do que o Sol, o que não é verdade. A ‘grandeza’ mencionada é de fato a magnitude absoluta do Sol, ou seja, o brilho verdadeiro da nossa estrela, nada tendo a ver com seu tamanho. Ainda assim, uma magnitude absoluta igual a cinco não quer dizer que o Sol seja a quinta estrela em ordem de brilho, porque a escala de magnitudes é contínua, logarítmica e abrange também valores negativos.


Crônica 071
Memórias Incontáveis de Incontáveis Memórias



O médico doutor Sérgio fez, além de sua graduação normal, cursou iridologia e abraçou a clínica de medicina natural na linha de Manuel Lezaetta que publicou o livro ‘Medicina natural ao alcance de todos’. Livro de cabeceira da maioria dos naturalistas. Antes de conhecer o doutor Sérgio, servindo-me de uma consulta marcada em sua clínica e moradia no bairro Saboeiro, contíguo ao Cabula, em Salvador na Bahia, anos atrás, tinha eu constante mal-estar sem gravidade, a exemplo de torcicolos, dores de cabeça, enxaqueca, flatulência, má digestão, dores na coluna cervical, dores nas pernas, cálculo nos rins que a cada dois anos tinha de me dirigir à emergência do Hospital Jorge Valente, valendo-me do plano de saúde atendido ali.

A consulta durou aproximadamente duas horas, sentados, quase agachados, eu e o médico, em macios almofadões. Consulta única. Não precisei retornar nem para uma revisão. Segui rigorosamente a orientação que me foi dada, adquiri o livro de Lezaetta e levei doze meses dentro daquele figurino que me foi presenteado.

Referindo-se às minhas bienais crises renais que me eram acometidas o médico e naturalista, no dia de minha consulta, informou-me de que eu ainda teria uma última crise renal num lapso de tempo de noventa dias. Sessenta dias após, e com a prática da alimentação e de procedimentos por ele recomendados, sem tomar remédio nenhum, ocorreu-me a predita e dolorosa crise renal, talvez a de maior sofrimento porque não pude dirigir o veículo e fui conduzido ao hospital. São passados trinta anos de vida frugal e nenhuma outra crise renal no ‘pindorama da vida’ e todos os achaques desapareceram. Tornei-me numa pessoa de plena saúde. Dor de cabeça, tão comum às pessoas em geral, é expressão que não existe em meu glossário.

Tive informação de que o médico, iridologista e terapeuta, doutor Sérgio foi residir na Chapada Diamantina, dedicando-se ao naturismo, saúde holística, no vale do Capão, Bahia.